Subitamente, a juventude apercebe-se da importância de ser tolerante. Acho magnífico. Se há algo que este mundo precisa é de mais tolerância em relação a maior parte das coisas e de tolerância zero em relação a outras. Porque está tudo ao contrário - excluímos os excluídos e damos margem de manobra a quem não devia ter (por exemplo, assaltantes deviam ser alvejados nas pernas).
Não interessa. O facto é que agora todos gostamos de ser tolerantes e fazemos questão de impor esta nossa nova discoberta aos outros. Não sei o quanto isto é realmente nobre porque, como bem sei, a directiva principal da mente da juventude (e provavelmente não só, mas é entre estes que vivo) actual é "Eu sou melhor que os outros, e vou mostrá-lo". Portanto propagandear a tolerância e dar-mo-nos como exemplo perde um pouco a beleza.
Além de que este ensinar da divina tolerância é um pouco uma treta. Não é verdadeiro ainda noutro sentido que é o de não ser completamente imparcial, como devia. Ou seja, eu posso falar mal do que eu quiser, mas a atitude tolerante só me vai ser pedida/ensinada/imposta se eu falar mal de alguma coisa que de algum modo toque o educador. Porque se a outra pessoa for igualmente racista e descriminadora quanto eu em relação a determinado aspecto, vai falar mal comigo.
Digamos que falo mal da religião. Vem um ateu e fala mal também, falamos mal os dois. Vem um religioso e diz-nos que devíamos respeitar e ser tolerantes. E de repente apetece-me falar mal de... indianos. Pois o ateu, que namora com uma indiana, vem dizer-me que não devia falar mal mas sim aceitar e tolerar. Por sua vez o religioso, que se calhar perdeu o emprego porque um indiano ficou com ele, vem falar mal do indiano comigo.
Portanto maior parte dos ensinamentos sobre tolerância que andam aí não são bem um "Sê tolerante na vida" mas um "Sê tolerante na vida com as coisas que me dizem respeito, ou em relação às quais discordamos".
Isto deriva muito da existência de uma das
grandes manias actuais do mundo jovem. Ensinar a outro o modo "como deve ser" é, não sempre mas sim em muitos casos, estar numa posição superior que o outro ainda não alcançou. É um excelente método de valorização. Não que seja sempre este o motivo, mas também não é sempre o motivo nobre de altruísmo... de facto, creio que raramente seja esse segundo.
Já que falo nisto, vou referir o tema "conversão religiosa". Duvido sempre muito de quem tenta converter os outros à sua religião. Porque ouço imensos crentes dizer que cada ateu deve, pelo menos, algum respeito em relação à religião dos outros, mas nunca pensam que as tentativas de conversão partem do príncipio que "a minha crença é que é correcta, e tu deves adoptá-la porque estás errado". Não quero dizer que os crentes são mais intolerantes que os ateus. Há de tudo para todos os lados, como tudo na vida. Mas também não aceito que não aceitem que tal como há ateus que podiam respeitar um pouco mais a fé dos crentes, também há crentes que podiam respeitar um pouco mais a não-fé dos ateus.
Agora ia acabar o post com "E não digo mais nada" mas acho isso extremamente foleiro. A meu ver, serve para dar mais alguma força à argumentação exposta. Dá a impressão de que aquilo que dissémos já chega, que é forte suficiente para se aguentar de pé e sólido face a qualquer refutação. É um simples truque de retórica, não é?