É difícil situar o amor de família na escala dos vários tipos de amor de que o ser humano é capaz, mas é certo que é diferente do amor que se tem pelo amante, pelo marido, pela namorada. Amor à família é como o amor de gato.
Quantos são os que passam semanas fora e não sentem saudade da família? Claro que gostamos deles, da mãe e do pai, da avó até, mas passadas semanas sem os ver continua a não haver qualquer urgência, qualquer saudade invasiva ou depressiva. Por outro lado, quando pequeninos, não passamos sem a mamã. Isto é fácil explicar: quando somos pequenos a mamã é necessária. Cuida de nós até conseguirmos fazer tudo sozinhos. Depois deixa de ser útil. Continuamos a gostar dela, mas deixa de ser útil. Mesmo quando a mamã ou o papá são más pessoas, nunca na vida nos esquecemos que são pais e mães. É escusado fugir ao facto de que deram tudo por nós e, por serem presenças constantes na nossa vida, nos habituamos a eles. Mas veja-se o amante ou o namorado: é uma saudade sofrida, custosa. Uma espécie de amor de cão que, mesmo vendo o dono a viver de caixotes do lixo, se mantém fiel e companheiro.
A família é portanto como um amor de gato. Os gatos não gostam dos donos, mas da casa deles. Da comida deles, das festinhas deles. Do conforto e do abrigo ao frio ou à fome. Se a casa arde e o dono fica confinado aos caixotes do lixo, o gato procura um dono mais útil. A diferença para o amor de família (humano) é neste segundo ponto. Por uma questão de hábito, ninguém deixa a família numa situação má. Tanto por hábito como por amor, mas um amor criado a partir da utilidade.
(teoria muito provavelmente errada, facilmente refutável, e eu sei disso)